terça-feira, 18 de setembro de 2018

Um Pouco da Minha História




CEIA AO LUAR -  FAVELISMO -  J. Vicente




Um Pouco da Minha História


Pai nordestino e mãe carioca, fui, como assim dizer, adotado aos dois anos, por minha avó paterna, alagoana de Palmeira dos Índios, lugarejo distante 150 quilômetros de Maceió, capital de Alagoas – nordeste do Brasil.

Voltando um pouco ao passado, minha avó, nasceu – mais ou menos – em 1898, digo mais ou menos porque na época os registros ocorriam quando os pais lembravam ou quando a pessoa, já adulta precisava da certidão de nascimento e essa eu nunca tive acesso.
Outro episódio que marcou a existência de minha avó foi que  lá pela década de 40 do século XX, fugindo, do pai de seus filhos que, por ela ser muito bonita, ele tinha loucas crises de ciúmes, foi parar no Rio de Janeiro - RJ, Cidade Maravilhosa, em que se radicou até o fim da sua vida.

Bela morena clara, estatura mediana, cabelos lisos e castanhos, nariz afilado estilo europeu, apesar de parecer de origem indígena, olhos cor de mel era um exemplar de mulher que inspirava os mais torpes e sublimes sonhos.

Ela tinha três filhos dos quais meu pai era um deles e um outro, que era carteiro faleceu num acidente de trem, ficando ela então com dois filhos e uma filha.

Chegando ao Rio de Janeiro foi morar numa chamada "cabeça-de-porco" ou casa de cômodos que era num prédio de dois andares sito à Rua Bento Ribeiro, número 19 ², no Bairro da Saúde, centro do RJ, onde, para sobrevivência, lavou e passou roupa para terceiros e explorava uma pensão³ onde cozinhava e vendia refeições. Dessa forma ajudava aos filhos e a meu pai, como tal – é aí que eu começo a participar da sua vida -   Me educou, inclusive em ginásio particular. 
Até os seis anos não tenho registros de minha infância. Dos sete anos em diante recordo de minhas peripécias infantis, que numa primeira fase, bem contido, eu era mais companheiro da minha avó, e inclusive auxiliava em algumas pequenas tarefas de casa e trabalho da D. Maria, seu nome de batismo. 
Muito boas lembranças da fase escolar, naquela época - primário e ginásio - todas ligadas aos amigos e amigas, cujas residências eram no morro da Providência e nas cercanias. 
Ocupávamos, até os idos de 1961, ela, eu, minha tia e meu tio, dois cômodos e mais uma parte da cozinha comunitária do andar. O banheiro também era de uso comunitário. As dependências de uso comum e mais vários quartos e uma área de serviços, com tanques e varais para se estender roupas eram ladeados por um corredor e ao mesmo tempo terraço de onde avistávamos o Morro da Providência e a Pedreira São Diogo, que pouquíssimas vezes ouvimos funcionar. A bem da clareza deste depoimento, morávamos no segundo andar do prédio. Aos 17 anos tivemos que desocupar a nossa moradia, por motivo de desapropriação para demolição - assim ficamos sabendo -.

Com muita saudade narro os acontecimentos, ora quando falo de mim e da família, ora quando falo do Rio de Janeiro por mim frequentado.
Na escola primária - Escola 4.l República da Colômbia - era um moleque mais ou menos aplicado, porém em matéria de disciplina "um desastre", pois brigão ao extremo vivia envolvido em confusão. Os fatos não resultaram em maiores danos. O tempo, as sovas e as repreensões - na rua e em casa - e a tolerância dos adultos que me cercavam se incumbiram dos reparos no comportamento, graças a Deus! Afinal eu não era "perda total" pois era bem educado e respeitador dos mais velhos, salvo num ato de rebeldia, em que devolvi um apagador contra mim arremessado pela professora. Felizmente minha pontaria não era lá essas coisas.
A rua em que eu morava era e ainda é muito próxima à Central do Brasil. Local de muita movimentação de trabalhadores, vadios, desocupados, malandros, prostitutas, cafetões e todas as espécies de aproveitadores do descuido alheio. Era um antro de perdição. Eu da sacada do meu quarto apreciava as desavenças entre os arruaceiros, cachaceiros, gatunos e brigões de todos os níveis. Eram acontecimentos de toda natureza.
Mesmo morando naquela selva nunca fui influenciado pelo que via e/ou ouvia. Minha avó, nordestina de pouca ou nenhuma instrução foi a que mais me influenciou, pois a mulher de fibra, trabalhadeira e honesta não media esforços para que eu fosse educado com retidão, ainda como complemento quando eu não me portava como ela orientava, bastava uma pequena ameaça: 
- " vou contar pro teu pai" - que eu logo aquietava. 
Logo no curso ginasial eu era mais ou menos aplicado. Nas matérias que eu gostava costumava ir bem, era o caso de matemática, desenho, carpintaria, cerâmica, canto, inglês, francês e até mesmo português, ao contrário de latim, geografia e história, que eu só fazia para passar de ano e apertado. De todas as disciplinas as que eu me destacava eram desenho e matemática. No caso de desenho a professora sempre me dava um zero por comportamento e como eu ia bem nas provas das três notas a média era sempre 6, ou seja nunca conservei a média 10 conseguida nas provas e trabalhos.
Falando de artes, além do ginásio nunca fiz curso algum de desenho ou pintura, na minha fase mais primitiva. Sempre fui autodidata, a vida inteira, mesmo amando o desenho e a pintura minha ligação era apenas por meio dos livros onde observava obcecadamente técnicas, ideias e até as biografias dos grandes pintores.
A curiosidade sempre me   motivou e moveu. Minha inserção nas artes foi quase que instintiva. Eu sentia a necessidade de pintar, desenhar, criar, enfim estabelecer um elo entre o meu ser e a arte. Sempre apreciei os quadros, as esculturas e as formas dentro desse universo. Os grandes pintores provocaram em mim, interesse de também me manifestar por meio das telas, pincéis, espátulas e tintas nesse contexto muitas vezes sombrio pouco alvissareiro para os que se lançavam no campo. 

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